O marketing hoje, principalmente para empresas que vendem para outras empresas, parece cada dia mais confuso. Talvez mais do que em qualquer outro momento da humanidade.
Todo dia surge uma nova atualização de algoritmo, uma nova tecnologia, uma nova tendência. Mas quando tudo é colocado na balança, sendo muito transparente, nenhum de nós tem convicção do que de fato funciona hoje, e que por funcionar hoje, amanhã ainda estará de pé quando acordarmos.
Do "barulho do marketing" para a realidade do caixa
Qual é a primeira linha que é cortada do orçamento quando a empresa enfrenta desafios de caixa? Sim, o marketing.
E o engraçado é que eu já estive nas duas posições dentro dessa situação. Já estive do lado de quem reclama do corte no orçamento e também de quem toma a decisão de cortar. Sendo muito sincero, ambos os lados têm suas razões.
Hoje eu não quero defender um lado ou o outro, mas quero falar especificamente sobre o marketing dentro desse contexto.
Por que toda essa confusão acontece? Como encontrar um caminho no meio de tantas possibilidades?
Do corte para a origem do problema (planejamento)
Sempre que estou discutindo orçamento anual e planejamento estratégico com lideranças nos negócios, uma das minhas maiores incomodações é a dificuldade que temos em fazer definições quanto a área de marketing.
Se olhamos para o âmbito de tecnologia, por exemplo, é relativamente fácil alocar os recursos.
Contrataremos neste novo ano um líder de tecnologia especializado no sistema que utilizamos e ele terá como objetivo aumentar em 25% a eficiência operacional por meio de otimizações no uso de ferramentas já presentes na empresa.
— Quanto esse líder vai custar? R$ 8.500,00 por mês.
Quanto teremos de retorno se ele atingir o objetivo? Uma economia de R$ 30.000,00 por mês. Deixaremos de fazer algumas contratações ao longo do ano e ainda aumentaremos a segurança da entrega final.
— Aprovado! Quando começamos?
Apesar das variáveis que sempre estarão presentes, percebe como é simples?! No entanto, quando chegamos na linha de marketing, o desafio é enorme.
Afinal, existem inúmeras estratégias de marketing possíveis e cada uma traz uma perspectiva diferente.
O líder 1, por exemplo, traz a ideia de que o melhor caminho é fazer reels inspiracionais no Instagram e artigos densos no site da empresa. Ele também fala da importância do tráfego pago que trará clientes todos os meses.
O líder 2 comenta que o seu cunhado, que também é empresário, pode fazer alguns posts de conteúdo no LinkedIn e gerar resultados, pois os possíveis clientes não estão no Instagram, mas sim no LinkedIn.
O líder 3 traz a ideia de patrocinar o time de futebol da cidade e contratar uma equipe de mídia para fotografar o dia a dia da equipe e postar no Instagram.
E quando chegamos a nível de composição de equipe?! O desafio é ainda maior. Todo esse cenário gera uma incerteza enorme para os tomadores de decisão.
No final do dia, ninguém consegue afirmar com convicção o que potencialmente trará um resultado satisfatório para a companhia e eu tenho a sensação (não posso afirmar) que existe certa rivalidade. Quero dizer algo do tipo: se a direção que eu sugeri não foi a escolhida, a outra não dará certo ou ficarei dando cutucadas e enviando qualquer tipo de material que reafirme o que eu falei durante a reunião de planejamento.
Todo esse cenário é fruto da incapacidade das lideranças, e da própria área de marketing, de trazer com clareza e convicção o que se almeja e os meios para alcançar os objetivos.
Um retorno aos fundamentos
Mas então, por onde começar? Qual o melhor caminho? Eu acredito que a chave está nos fundamentos.
No livro This Is Marketing, Seth Godin define marketing da seguinte forma:
"O marketing é um ato generoso de ajudar os outros a se tornarem quem almejam se tornar. Envolve a criação de histórias honestas que repercutem e se difundem."
Ele ainda pontua qual a obrigação dos profissionais de marketing:
"Nós contamos histórias que repercutem e se sustentam ao longo do tempo. Fazemos com que as pessoas sejam vistas e conhecidas. Que elas façam parte de algo. Criamos experiências com intencionalidade."
"Preciso aprender a ver como os seres humanos sonham, decidem e agem. E se eu conseguir ajudá-los a se tornar melhores versões de si mesmos, quem almejam ser, sou verdadeiramente um profissional de marketing."
Acredito que esse deveria ser o ponto de partida na construção de qualquer plano ou perspectiva sobre a área de marketing.
Se você partir do princípio que o seu marketing precisa ajudar os potenciais clientes a se tornarem quem almejam ser, você já resolve, pelo menos, 60% desse desalinhamento.
Se a sua empresa é um negócio de consultoria financeira, por exemplo, você pode encontrar vários anseios dos seus clientes. Vamos resumir em três possíveis:
O seu cliente pode estar querendo abrir um novo negócio e começar de forma organizada.
O seu cliente pode estar vivendo um desafio financeiro e precisa de alguém que organize a casa.
O seu cliente pode estar vivendo um momento estável, mas busca apoio externo para avançar
Perfeito! Dado esses três cenários, quais caminhos seguir? Qual mensagem transmitir?
O caminho é começarmos garantindo que estamos adequados ao setor em que estamos atuando. Ou seja, como esses potenciais clientes consomem? Onde eles gastam tempo?
Eles estão nos camarotes do estádio de futebol da cidade? Eles estão ouvindo podcasts? Viajando pelo país buscando feiras de negócios? Acompanhando o crescimento dos sobrinhos ou netos no Instagram?
Entendendo esses aspectos, você já garantiu algumas vantagens. Agora vamos analisar outro ponto.
“O núcleo de uma boa estratégia é o reconhecimento do desafio e o foco de recursos e ações em poucos objetivos críticos.”
Essa frase de Richard Rumelt em “Good Strategy Bad Strategy”, traz para nós uma visão importante sobre foco.
Não faz sentido querer estar em todo lugar ao mesmo tempo. Por mais que você tenha uma equipe extremamente capacitada e condições para ocupar um espaço relevante, faz muito mais sentido utilizar esses recursos para imprimir mais velocidade em pontos focais (uma só coisa) e não em várias ao mesmo tempo.
Se você optou, por exemplo, por garantir que a empresa estará em todas as feiras de negócios do país, dedique o máximo de recursos e energia até garantir que existe um resultado efetivo e condições o suficiente para um “novo caminho".
Agora que você já conhece os anseios do seu potencial cliente, onde eles estão e gastam tempo e que precisamos centralizar os recursos com um plano objetivo e consolidado, trago aqui um possível exemplo de uma estratégia a ser utilizada.
01) O início de tudo: A nossa comunicação estará sempre dirigida para o momento vivido pelos clientes. Ou seja, ou ele estará querendo abrir um novo negócio e começar de forma organizada ou vivendo um desafio financeiro e precisa de alguém que organize a casa ou vivendo um momento estável, mas busca apoio externo para avançar.
02) Os canais: Dado que temos três possíveis momentos de vida, podemos definir os canais com uma visão de pontos em comuns ao invés de pontos específicos. Por exemplo: eles frequentam estádios de futebol. Mas é mais provável que estejam no estádio ou em uma feira de negócios? Sim, feira de negócios. Logo, a visão de canais, nesse caso, seria focada em patrocínios (ou a simples participação) nas 10 maiores feiras de negócios do país. A depender dos recursos, leve outros membros da equipe. Prepare uma forma de captar as conexões. Invista em técnicas de comunicação. Dependendo do momento da empresa, quem sabe também construir uma “lista de espera” para produção de podcasts? Pode ir em um desses eventos com o foco de encontrar potenciais clientes e convidá-los para um podcast que realizará no ano seguinte (ou próximo semestre). Talvez essa seja uma excelente forma de manter a conexão e parecer interessante.
03) A consolidação: Por último, e não menos importante, vem a consolidação da efetividade de tudo isso. E aqui é importante que as lições aprendidas, os ajustes de orçamento, os pontos de melhorias, todos sejam efetivamente registrados para consulta futura. A cada novo plano, a ideia é que a área de marketing esteja cada vez mais madura e previsível.
Mas, Lucas. Isso é muito simples… De fato, trouxe aqui uma visão superficial e simplória do que pode ser o seu planejamento de marketing. Existem outros fatores que entram nessa conta, outras questões a serem levadas em consideração e, principalmente, quem vai dirigir todas essas iniciativas (por mais simples que sejam). E falando em simplicidade, lembre-se:
“A simplicidade é o último grau de sofisticação.” — frase atribuída a Leonardo da Vinci
O que não se pode deixar de lado
Existe um aspecto aqui que é de muita importância e que não pode, jamais ser negligenciado pela empresa, independente do seu segmento: o institucional.
Apesar de vivermos em um momento complexo enquanto marketing, é importante que a empresa marque presença onde os seus clientes e concorrentes estão. Ter um bom website, estar presente em uma ou duas redes sociais compartilhando, por exemplo, os movimentos da empresa é fundamental não somente para o potencial cliente, mas também para o fortalecimento da cultura interna, o orgulho de pertencer e para atrair potenciais talentos para o negócio.
Um relatório da Deloitte (2021) mostra que 77% dos consumidores esperam que as empresas tenham uma presença clara em canais digitais e comuniquem não apenas produtos, mas também valores. Isso reforça que o institucional não é um detalhe, mas um componente estratégico para reputação, cultura e competitividade.
E quando falamos de institucional, é essencial considerar todos os pontos de contato da empresa e a forma como comunica seu valor. Aqui entra uma disciplina extremamente profunda e importante para o valor dos negócios, o branding.
Então, aconteça o que acontecer, não perca de vista (e nem deixe de investir) na construção e fortalecimento do institucional. Ele sustenta a confiança do mercado, o orgulho interno e a capacidade de atrair talentos.
Aumentando a taxa de sucesso com consistência
Os negócios, principalmente em seus estágios iniciais, centralizam todos os papéis de direção da empresa e uma ou, no máximo, duas pessoas que ocupam um cargo de alta liderança. E é natural que esses indivíduos precisem dedicar a maior parte do tempo em maximizar os lucros da companhia.
Pela complexidade da área como vimos por aqui, e por vezes por falta de conhecimento, o marketing se torna mais uma conversa complexa sobre desejos pessoais e linhas de despesas do que uma direção com clareza e custos (e também despesas) aliadas ao relatório de aprendizados no ano anterior.
Por isso, sempre sugiro que a empresa tenha alguém responsável por consolidar os projetos estratégicos (não apenas de marketing). Esse profissional organiza dados históricos e lições aprendidas. Assim, as decisões deixam de ser baseadas em achismos e passam a ter uma visão mais ampla e consistente. Alguém que toque o bumbo, mantenha um ritmo constante e contribua para a consolidação dos resultados.
“Se você quiser aumentar sua taxa de sucessos, duplique sua taxa de fracassos [...] Todas as vezes que progredimos na IBM foi porque alguém se dispôs a correr riscos, dar a cara a tapa e tentar algo novo.”
Essa frase do Thomas Watson, traz uma lição importante para fecharmos esse tema.
Ao cortar a linha de marketing do orçamento anual da companhia, você está tomando uma rota de fuga. A cada novo “fracasso”, você se aproxima ainda mais do sucesso. Logo, o melhor caminho não é simplesmente fechar os olhos e deixar ir, mas olhar com o que se é possível aprender e evoluir. Aqui está o sucesso.
Em última análise, construir negócios que resistem ao tempo e impactam gerações passa pelo método, pela clareza e principalmente pela verdade (nua e crua). E esse é o meu propósito.